sábado, 8 de janeiro de 2011

Entrevista de Dom Manoel (IV parte)


Quarta parte da entrevista de dom Manoel, na qual trata do assunto política.

A Revolução de 64 foi um alívio”

Luiz Carlos Bordoni — Como o senhor avalia, hoje, o regime militar de 64?

Sobre o período imediatamente anterior ao regime militar, não se tem mais coragem de dizer nada. Mas 63 foi terrível. Vivi em Santos. Lá, apenas neste ano, tivemos 97 greves. Inclusive uma greve de coveiros, numa cidade com 40 graus à sombra. O mau cheiro dos cadáveres em decomposição era terrível. Meu pai era doqueiro no porto de Santos. Meu avô era estivador. Quem não aceitava aquela linha de greves e mais greves era simplesmente eliminado. O ministro do Trabalho da época, Valdemar Falcão, chegou a ir a Santos, apavorado com o número absurdo de acidentes de trabalho. Meu pai, por exemplo, foi atacado porque não quis coletar contribuições para o Partido Comunista entre os operários de sua turma. Ficou hospitalizado três meses por causa disso. A revolução de 64 foi uma revolta popular, porque ninguém mais suportava aquilo. Claro que, depois, foi usada. Todo poder corrompe. E o poder absoluto, corrompe absolutamente.

Euler Belém — O senhor participou daquelas marchas contra o governo João Goulart?

Participei, e de modo convicto. Mas tive uma grande decepção, logo no 1º de abril, quando foi eleito para vice-presidente o Alkmin. Todo mundo esqueceu qual foi o voto de um padre de São Paulo, no Congresso. Indignado, ele votou assim: “Para vice-presidente, Félix Galdeano”. As pessoas abafaram o riso, com medo. Félix Galdeano tinha sido o agenciador da famosa tramóia uísque a meio dólar. Nós nos sentimos traídos nessa hora, mas, antes, havia o perigo iminente de uma República sindicalista. Meu bairro era chamado de Kremlin, e Santos era a Moscou brasileira. Santos tinha 67 sindicatos. Quem levantava a voz contra essa situação era ameaçado de morte.

Euler Belém — João Goulart tinha algo a ver com isso? Ou foi um inocente útil?

Não tão inocente, mas era bastante útil. Felizmente, a maldade do homem é sempre maior do que sua inteligência, daí porque não existe crime perfeito. Jango foi uma vítima também, mas uma vítima consciente. Fazia parte da engrenagem.

José Maria e Silva — Como o senhor avalia o governo de Fernando Henrique Cardoso?

Fernando Henrique Cardoso continua sendo um enigma para mim. Estou com muito medo. Fernando Henrique integrou o Cepal. Também participou do famoso Fórum de São Paulo, que uniu os líderes da América Latina sob a liderança de Fidel Castro. Acho que ele prestou um grande serviço ao estabilizar a moeda, mas não podemos sacrificar tudo à moeda, como se fosse um bezerro de ouro. O que está faltando, além de coragem, é força política para impor certas reformas. Outra coisa que chegou ao absurdo, no Brasil, é a impunidade.

Euler Belém — O senhor está falando como uma pessoa de esquerda?

Não. Estou falando como uma pessoa que tem consciência dos valores cristãos.

Euler Belém — O senhor não acha que a política em Anápolis anda um tanto esquentada?

Evidente, se tudo é de fato como aparece. Penso que ainda deva haver muito estouro até que a pipoca salte e encha a panela. Seria muito bom se todos se deixassem investir pelo espírito do bem comum.

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